EPM conclui o seminário ‘O pensamento econômico e a construção da ordem jurídica’
Seminário teve três painéis.
No último dia 10 foi realizado o painel “A crise do liberalismo e a intervenção estatal”, que encerrou a programação do seminário O pensamento econômico e a construção da ordem jurídica da EPM. O evento contou com palestras dos economistas Paulo Rogério Scarano e Pedro Raffy e do professor José Eduardo Campos de Oliveira Faria e participação do desembargador Eutálio José Porto de Oliveira, coordenador do seminário.
Iniciando as exposições, Paulo Rogério Scarano discorreu sobre o tema “As transformações econômicas e sociais (1930)”. Ele recordou os eventos que contribuíram para a quebra da bolsa de valores de Nova York, em 1929, que teve como consequências a inibição de novos investimentos e a diminuição considerável do poder de compra da população. O palestrante ponderou que não se deve atribuir unicamente à quebra da bolsa a responsabilidade pela grande depressão que se seguiu, apontando outros fatores, como a queda do PIB real, que diminuiu 30% entre 1929 e 1933 – ponto mais baixo da depressão; a taxa de desemprego, que atingiu um quarto da população economicamente ativa; e o processo deflacionário, que chegou a 9% ao ano e favoreceu o entesouramento (retenção) de moeda.
Paulo Scarano lembrou que, além de atingir fortemente os Estados Unidos, a crise também chegou à Europa. Nesse contexto, salientou o descontentamento generalizado e a adoção paulatina de medidas protecionistas pelos países.
Eutálio Porto observou que houve também uma mudança na estrutura jurídica no período. “Imaginava-se que teríamos um Estado em que a Justiça seria feita pela mão oculta do mercado, mas, a partir da década de 1930, começou-se a perceber que era preciso uma intervenção maior do Estado na economia, o que provocou alterações substanciais no Direito. É o que aprendemos como o direito de segunda dimensão ou direito de segunda geração, que são os direitos sociais, que até então não existiam e que foram incorporados no ordenamento jurídico”, esclareceu. Ele acrescentou que essa fase de intervenção permanece até hoje e que, do ponto de vista econômico, há uma disputa a respeito do modelo de Estado que a sociedade irá trilhar.
Em seguida, Pedro Raffy abordou o tema “O Estado do bem-estar social e os direitos sociais: Keynes / Hayek”. Ele destacou o debate realizado durante a grande depressão a respeito das ideias do economista britânico John Maynard Keynes (1883 – 1946), que defendia maior intervenção do Estado para solucionar a crise, e do economista e filósofo austríaco Friedrich Hayek (1899 – 1992), coautor da teoria dos ciclos econômicos, que inclui entre as causas de baixas na economia o excesso de crédito e a diminuição artificial dos juros pelo Banco Central.
O palestrante lembrou que a visão keynesiana prevaleceu, de modo que a atuação do Estado na economia como interventor e como agente capaz de solucionar a crise ganhou espaço no debate econômico. Mas observou que, no período mais recente, o excesso de intervenção do Estado começou a ser questionado, porque ficou evidenciado, tanto na América Latina quanto em outras partes do mundo, que esta proteção tem produzido resultados como a alta inflação, como ocorreu na recente crise brasileira.
Pedro Raffy recordou que, para Keynes, havia três geradores principais de insuficiência de demanda da economia: o consumo das famílias, o investimento das empresas e os gastos do governo. Dentre os três, apontava a instabilidade no investimento das empresas como causa da crise. Ao deixarem de gerar produção, afetaram o consumo das famílias. E, nesse cenário de queda do produto, a inflexibilidade salarial acentuou o problema ao provocar desemprego.
Em relação à visão de Hayek, lembrou que ele considerava que a crise tem origem no excesso de crédito: os governos, ao estimularem de forma excessiva as economias, por intermédio de uma taxa de juros baixa, por exemplo, geram sinais equivocados aos mercados. A abundancia de liquidez na economia produz a sensação de que é fácil comprar bens e serviços, o que permite a ocorrência de um artificialismo no preço dos ativos.
Em seguida, José Eduardo Campos de Oliveira Faria discorreu sobre o tema “A crise do Estado do bem-estar social (Welfare State) e os novos rumos do Direito”. Ele recordou inicialmente que, entre 1989 e 1999, dois terços dos países vinculados à Organização das Nações Unidas (ONU) reformaram parcial ou integralmente as suas Constituições. Observou também que, do ponto de vista da legislação infraconstitucional, houve mudanças jurídicas no mesmo período, como o processo de reprivatização do Direito, reformas como a trabalhista (que pressupõem estratégias de flexibilização de direitos), desconstitucionalização de direitos e desburocratização da administração pública. E mencionou que, ao mesmo tempo, ocorreu a abertura da economia brasileira à economia mundial.
O palestrante destacou também o crescente deslocamento da produção jurídica de instâncias legislativas para instâncias não legislativas. “A partir da fragmentação do sistema partidário e do processo de crescente complexidade da decisão econômica, percebemos a substituição dos mecanismos deliberativos em determinadas matérias por sistemas de especialistas”, asseverou. E observou que decisões que seriam da alçada do Poder Legislativo têm sido sutilmente destinadas para organismos multilaterais como a Organização Mundial do Comércio (OMC) ou o Banco de Compensações Internacionais, que tem regulado o funcionamento de bancos centrais e privados.
José Eduardo Faria também mencionou a questão das reformas da legislação infraconstitucional. “Fala-se neste momento da reforma do Código Comercial. Também estamos vendo claramente a necessidade de uma Reforma Tributária”, ponderou. E observou que o denominador comum das reformas do Direito Comercial, Econômico e Tributário é a tendência de harmonização no mundo globalizado, que deverá atingir também os institutos jurídicos.
Outra tendência apontada pelo professor foi a ocorrência de profundas alterações no Direito Internacional Público. “Podemos identificar cada vez mais as práticas dos mercados, os códigos de Ética nas cadeias produtivas interpenetrando o Direito Internacional e convertendo o Direito Internacional Público, que deixa de preocupar-se com questões relativas a acerto de fronteira e resolução de problemas de conflito de território e passa a se preocupar com a questão de transterritorializacao dos mercados”, ressaltou.
LS (texto)