Aspectos contemporâneos da parentalidade são estudados no curso ‘Temas atuais de Direito de Família’
Cristiano Farias e Melissa Veiga foram os palestrantes.
O tema “Novas possibilidades de filiação e parentalidade: coparentalidade, biparentalidade, monoparentalidade e multiparentalidade e os aspectos familiares e sucessórios” foi discutido ontem (21) no curso Temas atuais de Direito de Família da EPM. A exposição foi feita pelo promotor de Justiça Cristiano Chaves de Farias e pela advogada Melissa Veiga e teve a participação do diretor da Escola, desembargador Francisco Eduardo Loureiro, e dos coordenadores do curso, desembargador Antonio Carlos Mathias Coltro e juiz Augusto Drummond Lepage.
Inicialmente, Cristiano Farias salientou que o ordenamento jurídico nacional desenvolveu um sistema de normas de parentalidade ímpar, diferente de quase todos os outros países, por possuir formas de expressão de parentalidade próprias. E destacou a rapidez da renovação da matéria: “há 15 anos não se pensava nas possibilidades jurídicas que temos hoje. Ele discorreu também sobre aspectos históricos da parentalidade, lembrando que a presunção de paternidade já estava prevista no Código de Hamurabi.
O professor esclareceu que há três critérios para definir o parentesco: presuntivo, biológico ou socioafetivo. Ele explicou que no parentesco presuntivo, presume-se que o filho da mulher casada seja filho do marido dela. Essa presunção, todavia, é relativa e pode ser contestada. Ele lembrou que, em caso de fertilização in vitro, a presunção da paternidade é absoluta, conquanto tenha havido prévio consentimento. E observou que também há a presunção da maternidade pela gestação, com exceção da maternidade por gestação em útero alheio.
Com relação ao critério biológico, enfatizou a importância do exame de DNA, recordando que há 20 anos esse exame era muito oneroso, sendo ainda comum a prova testemunhal, apesar da sua fragilidade. Ele lembrou que hoje esse exame é barato e acessível e não pode ser dispensado em processos de investigação de paternidade, devendo ser determinada a sua realização de ofício pelo magistrado, caso as partes ou o Ministério Público não o requeiram. E salientou que ninguém pode ser obrigado a realizar o exame contra a sua vontade (Código Civil, artigos 231 e 232), mas a negativa gera a presunção da paternidade.
No caso do critério socioafetivo, explicou que a relação parental é construída ao longo do tempo, com afeto e cuidados, e que a expressão “posse do estado de filho” visava conferir juridicidade a uma situação meramente fática. Ele esclareceu que a paternidade socioafetiva pode ser declarada após a morte, mas ressaltou que é preciso ter muito cuidado para não desvincular outros institutos. Ele recordou que essa modalidade era considerada uma espécie de adoção, que sempre rompia o vínculo biológico. No entanto, há dois anos, após o julgamento do recurso extraordinário repetitivo (RE nº 898.060/SC) o entendimento passou a ser no sentido de que a paternidade socioafetiva não rompe necessariamente o vínculo da paternidade biológica.
Cristiano Farias enfatizou que esses três critérios que definem a parentalidade não precisam ser excludentes. Podem ser concomitantes, gerando a pluriparentalidade, com todos os efeitos jurídicos dela decorrentes. E ressaltou que o magistrado pode declarar a parentalidade se ela já existir, mas não constituí-la.
Na sequência, explanou sobre os tipos de parentalidade: biparentalidade heteroafetiva, como o núcleo familiar básico, composto por um pai, uma mãe e filho(s); biparentalidade homoafetiva, na qual o núcleo familiar é composto por dois pais e filho(s) ou duas mães e filho(s); monoparentalidade, cujo núcleo é formado por apenas um pai e filho(s) ou uma mãe e filho(s); e a coparentalidade, na qual os pais não querem estabelecer uma relação conjugal, mas querem ter filho(s) e contratam a parentalidade, dispondo previamente sobre questões de guarda, visita, educação e alimentos dos filhos, cujas disposições podem ser alteradas de acordo com as circunstâncias fáticas posteriores.
Por fim, Cristiano Farias discorreu sobre os aspectos processuais das ações correspondentes ao exercício do parentesco: questões de competência, obrigatoriedade de prévia sessão de mediação, conforme o novo Código de Processo Civil, ações de investigação de parentalidade, investigação avoenga, negatória da paternidade, vindicatória do estado de filho, e ações determinativas do estado biológico (em casos de adoção, sem qualquer efeito familiar ou sucessório). Foram abordadas ainda questões envolvendo a construção jurisprudencial e legal relacionadas ao tema.
Multiparentalidade
Melissa Veiga discorreu sobre a multiparentalidade (ou pluriparentalidade), que tem o núcleo familiar composto por três ou mais pais e pelo(s) filho(s). Ela esclareceu que a multiparentalidade tem como fundamento o vínculo afetivo e/ou biológico. E explicou sobre os efeitos jurídicos decorrentes da multiparentalidade, relacionados aos sobrenomes a serem adotados, a ascendência (multiplicidade de avós), adoção da naturalidade afetiva, segundo a identificação do filho, parentesco, impedimentos matrimoniais, alimentos, guarda e visitação.
A palestrante discorreu ainda sobre os aspectos sucessórios, ressaltando que parentesco por afinidade somente há no Direito de Família, não no Direito Sucessório. Destacou também os efeitos processuais, com relação a legitimidade, formação de coisa julgada e intervenção do Ministério Público. Ela mencionou ainda a questão do preconceito implícito e ressaltou que na paternidade ou maternidade afetiva o que importa é a qualidade da relação, e não o tempo.
RF (texto e fotos)