EPM inicia novo curso de Direito de Família com debate sobre o Estatuto da Pessoa com Deficiência

Cristiano Farias e Melissa Veiga foram os expositores.

  

Com o tema “Aspectos controvertidos e aprofundados sobre o Estatuto da Pessoa com Deficiência à luz da jurisprudência do TJSP”, teve início ontem (1) o curso Direito de Família da EPM. A exposição foi feita pelo promotor de Justiça Cristiano Chaves de Farias, do Ministério Público da Bahia, e pela advogada Melissa Ourives Veiga e teve a participação do diretor da Escola, desembargador Francisco Eduardo Loureiro, e dos coordenadores do curso, desembargador Antonio Carlos Mathias Coltro e juiz Augusto Drummond Lepage.

 

Inicialmente, Melissa Veiga lembrou o status constitucional do Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD), conforme o artigo 5º, parágrafo 3º, da Constituição Federal, uma vez que o Decreto Legislativo 186/2008 recepcionou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, assinada em Nova York, em 2007.

 

Ela recordou como antes se reportava às pessoas com deficiência: “as mulheres já foram tidas por ‘especiais’, crianças e adolescentes também já foram tidos por ‘especiais’, mas não no sentido de sujeitos de direito, patamar que não alcançaram no mundo jurídico durante muito tempo”, observou. E ressaltou que tratar as pessoas como “especiais” não seria alcançar o que de fato elas são, na busca do respeito à sua dignidade.

 

A palestrante frisou que a proteção designada na Convenção de Nova York denominou-se como independência, porque, se antes essas pessoas eram tidas como “especiais” (restringindo sua liberdade), foi percebido que, na verdade, elas precisam de independência para exercerem todas as suas funções. “Assim o Decreto Legislativo recepcionou o tratado que fala especificamente e de forma ampla e objetiva sobre esses direitos que devem ser dados, protegidos para, acima de tudo, fazer com que essas pessoas se tornem cada vez mais independentes”, considerou, ponderando que o olhar que se deve ter a partir dessa percepção de igualdade e independência é que a lei serve como instrumento de inclusão social.

 

Melissa Veiga discorreu sobre aspectos materiais controvertidos do EPD, entre eles o alcance estrito da curatela aos atos negociais; a autonomia e a plena dignidade quanto aos atos existenciais; o descabimento de curatela por simples deficiência; e a tomada de decisão apoiada ao invés de curatela. Ela esclareceu que a deficiência não está ligada diretamente à necessidade de curatela, mas ao aspecto da manifestação de vontade. E frisou que não basta a pessoa exprimir a vontade, ela precisa saber quais são os efeitos daquela manifestação de vontade.

 

Aspectos processuais do EPD

 

Cristiano Chaves iniciou sua exposição salientando que o Estatuto da Pessoa com Deficiência envolve questões de ordem do Direito Público, acessibilidade, imposição de políticas públicas e ações afirmativas ao Poder Público e rediscussão da teoria das capacidades. “O Estatuto é de uma riqueza jurídica enorme, o que traz a necessidade de adaptar o sistema jurídico a ele. Temos uma ação de curatela renovadíssima”, enfatizou.

 

O professor explanou sobre os aspectos processuais do EPD à luz da jurisprudência do TJSP. Ele explicou a respeito do procedimento de curatela desde a petição inicial até a coisa julgada, com a possibilidade de levantamento da curatela. Frisou que a curatela é um procedimento de jurisdição voluntária, portanto é uma atividade privada chancelada pelo Poder Público.

 

Ele esclareceu que a curatela está disciplinada ao mesmo tempo pelo Código de Processo Civil (artigos 747 a 765) e pelo EPD. E explicou acerca da necessidade de harmonização entre as duas normas segundo o critério da especialidade e o diálogo das fontes normativas, posição prevalecente na jurisprudência (Fredie Didier Júnior e Robson Renault Godinho). Ele ponderou que, aplicando o critério da especialidade quando houver colidência das normas, incide o dispositivo que for mais protetivo.

 

O palestrante explicou que "curatela" seria a nomenclatura mais adequada, embora "interdição" não esteja errado, segundo o CPC. Ele discorreu acerca de diversos aspectos relacionados à curatela, entre eles a legitimidade, competência territorial para processá-la e julgá-la e outras questões processuais. Explanou também acerca da necessidade de a sentença especificar a extensão dos poderes do curador, que pode ser desde assistência até representação. Ele salientou que tanto o EPD quanto o CPC estabelecem certas perguntas que o juiz deve fazer, sobre a vida, relações pessoais e familiares, vontades e preferências, inclusive sobre a curatela, porque na sentença o juiz precisa fixar o projeto terapêutico individualizado. E, caso não nomeie a pessoa escolhida pelo curatelando como curador, o juiz precisa justificar.

 

Cristiano Chaves observou que muitos casos que outrora eram de curatela agora são de tomada de decisão apoiada (TDA) e, mesmo quando o pedido é de curatela, o juiz pode deferir a TDA, pois nos procedimentos de jurisdição voluntária, ele pode decidir por equidade.

 

Ele ressaltou que se a curatela agora é exceção, a liminar é mais exceção ainda. E citou precedentes do TJSP que demonstram que a concessão se tornou medida excepcionalíssima. “Muitas vezes essa curatela provisória pode gerar danos irreversíveis”, observou.

 

Por fim, lembrou que o benefício previdenciário independe de curatela. “O termo de curatela não pode ser exigido pelo INSS para deferir beneficio previdenciário. Um tem a ver com capacidade civil e o outro com capacidade para o trabalho e não se confundem”, concluiu.

 

RF (texto e fotos)


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