EPM inicia o curso ‘Lei nº 13.874/2019 (Liberdade Econômica) e o Direito Empresarial: alterações introduzidas no Código Civil’
Paulo Furtado e Otávio Yazbek foram os palestrantes.
Teve início no último dia 11 na EPM o curso Lei nº 13.874/2019 (Liberdade Econômica) e o Direito Empresarial: alterações introduzidas no Código Civil, com exposições do juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho e do professor Otávio Yazbek. O evento teve a participação do diretor da Escola, desembargador Francisco Eduardo Loureiro, e dos coordenadores do curso, desembargador Marcelo Fortes Barbosa Filho e juíza Renata Mota Maciel.
Iniciando as exposições, Paulo Furtado dissertou sobre as alterações do Código Civil introduzidas pela Lei de Liberdade Econômica (Lei nº 13.874) em relação às sociedades empresárias. Ele explicou que a lei positivou a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, fundamentando essa autonomia como um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, com a finalidade de estimular empreendimentos para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos (artigo 49-A do CC), desde que a limitação da autonomia patrimonial seja respeitada e não seja usada para fins ilícitos.
O palestrante explicou que essa autonomia patrimonial não se dá em função da autonomia patrimonial da sociedade propriamente, mas da proteção do patrimônio dos sócios com a limitação de sua responsabilidade. E isso tem a função de fomentar os empreendimentos, incentivando os sócios a aportar recursos para a sociedade. Ele esclareceu que o legislador deixou claro que isso não se refere a qualquer pessoa jurídica, mas à que exerce atividade empresarial.
Paulo Furtado explicou que nesse e em outros pontos a lei positivou o que já estava solucionado pela jurisprudência e doutrina em geral. Ele dissertou a respeito da desconsideração da personalidade jurídica, salientando que também devem ser responsabilizados os sócios que não se beneficiaram, mas conheciam o ilícito, pois tinham o dever de impedi-lo, mas permitiram que outro sócio utilizasse indevidamente a pessoa jurídica. E explicou que a desconsideração pode atingir não só sócios, mas também pessoas jurídicas que foram utilizadas pelo sócio ou administrador em manipulação. Como exemplo, mencionou os casos em que se mingua uma sociedade a bem do surgimento de outra em seu lugar.
O expositor esclareceu que havia na Medida Provisória nº 881/2019 um dispositivo que disciplinava a extensão dos efeitos da falência à sociedade surgida em detrimento da falida, admitindo-a quando estivessem presentes os requisitos da desconsideração da personalidade jurídica. Contudo, esse artigo não foi reproduzido na lei. E acrescentou que em outro projeto de lei que está em vias de ser aprovado na Câmara dos Deputados há um dispositivo proibindo a extensão da falência. “Em casos graves de confusão patrimonial proibir a extensão da falência parece um desacerto, mesmo porque a preservação da atividade pode ocorrer com a venda rápida dos ativos”, ponderou.
Paulo Furtado discorreu ainda sobre desvio de finalidade, confusão patrimonial, ônus da prova e requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica e apontou dispositivos da nova lei que contrariam o Código Civil e a Lei de S/A. “Não há liberdade absoluta nem para os administradores nem para os sócios. Esse desvio de finalidade, esse desvio do objeto social pode comprometer o patrimônio dos credores. Parece-me que uma interpretação sistemática da legislação deve chegar à conclusão de que desvio de finalidade também é desviar a sociedade de sua atividade, porque toda legislação societária exige de sócios e administradores que pautem sua conduta pelo objeto social”, ponderou, ao comentar o parágrafo 5º que fora acrescentado ao artigo 50 do CC.
Fundos de investimentos
A seguir, Otávio Yazbek discorreu sobre os fundos de investimentos, esclarecendo que pela primeira vez no Direito brasileiro tem-se a criação de um regime legal mais ou menos uniforme para eles. “Isso é útil porque nos dá as bases para decidir com mais segurança temas bastante complexos e porque ajuda a eliminar ou reduzir polêmicas como a natureza jurídica dos fundos de investimentos, dos cotistas. Por outro lado, em alguns pontos a lei em estudo criou mais dificuldades do que soluções”, observou.
Ele apresentou um panorama histórico-legislativo a partir da década de 1960 sobre a indústria de fundos de investimentos como é denominada (embora se trate de prestação de serviços). Explicou que eles cumprem um papel importante ao permitir o investimento coletivo, pela eficiência em angariar grande montante de recursos. E esclareceu que a administração dos fundos passou a ser feita por um administrador profissional.
O palestrante ressaltou que no mercado brasileiro os fundos de investimentos começaram a ser usados para muitas outras finalidades que não os multimercados. Como exemplo, citou os fundos imobiliários que são “pequenas sociedades anônimas”; a indústria de securitização de recebíveis que surgiu no Brasil como fundos de investimentos; e a indústria de private equity, que se organizou sob a forma de fundos de investimentos, entre outros. “Antes, tínhamos fundos que se destinavam meramente a fornecer investimentos para um público investidor mais ou menos amplo. Agora, temos fundos que são um pedaço em uma engrenagem muito mais complexa de operações estruturadas de financiamento”, observou. “Quando falamos em regulamentação de fundos de investimentos, na verdade falamos de várias espécies diferentes de operações e muitas das demandas da lei nasceram dessas outras espécies”, ressaltou.
O professor discorreu sobre as figuras do administrador, do gestor, do custodiante e dos prestadores de serviço terceirizados, como os encarregados da parte contábil e fiscal, explicando a responsabilidade de cada um. “Para evitar que haja diluição da responsabilidade perante os cotistas, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) exige que o administrador exija cláusula de responsabilidade solidária dos prestadores de serviços, mas não em todos, varia de caso a caso”, esclareceu, acrescentando que essa solidariedade tem sido fonte de muita polêmica mas é muito importante para garantia do investidor.
Otávio Yazbek discorreu sobre os principais pontos de evolução com a nova lei. Entre eles, as implicações da afirmação da natureza jurídica do fundo de investimento como sendo uma “comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de natureza especial, destinado à aplicação em ativos financeiros, bens e direitos de qualquer natureza” (novo artigo 1.368-C do CC); possibilidade de limitação da responsabilidade do investidor ao valor de suas cotas; possibilidade de limitação de responsabilidade dos administradores do condomínio entre si sem solidariedade (dependerá de regulamentação pela CVM); possibilidade de a CVM prever classes de cotas com direitos e obrigações distintos; aplicação da regra de insolvência civil se o fundo de investimento com limitação de responsabilidade não possuir patrimônio suficiente para responder por suas dívidas (novo artigo 1.368-E, parágrafo 1º, do CC).
Também participaram do evento os desembargadores Paulo Roberto Grava Brazil e José Araldo da Costa Telles, entre outros magistrados, servidores e outros profissionais do Direito.
RF (texto e fotos)