Acordo de não persecução penal, prisão e colaboração premiada são debatidos em curso da EPM
Evento teve expositores da magistratura, MP e advocacia.
Os temas ‘Experiências na implementação do Pacote Anticrime, justiça negociada, prisão e colaboração premiada’ foram debatidos na aula de ontem (29) do curso Experiências na aplicação do Pacote Anticrime (provas e cadeia de custódia, justiça negociada e prisão) e júri virtual da EPM, com exposições da ministra do STJ Maria Thereza de Assis Moura, do promotor de Justiça Rogério Sanches Cunha e do advogado Pierpaolo Bottini.
Iniciando as exposições, Maria Thereza Moura explanou sobre o acordo de não persecução penal, regulamentado pelo Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019). Ela esclareceu que ele se insere no rol de institutos da justiça consensual e gera economia de recursos públicos e maior celeridade da Justiça criminal nos casos menos graves, cuja pena mínima prevista seja inferior a quatro anos. A ministra explicou a diferença em relação a outros institutos do Direito Penal, como a transação penal, a suspensão condicional do processo e o sursis (suspensão condicional da pena).
Entre as vantagens do instituto, ponderou que pode ser considerado um aperfeiçoamento do sistema de Justiça com a redução do número de processos criminais e, a médio prazo, do número de pessoas inseridas no sistema prisional. Ela lembrou que atualmente há mais de 800 mil presos, sendo 40% com cumprimento provisório da pena e 25% com condenação em segundo grau. Como principal crítica, apontou o utilitarismo, porque a mera intenção de reduzir o acervo processual não seria motivo suficiente para inserir a exigência de confissão.
A ministra explicou a natureza jurídica do acordo de não persecução penal: negócio jurídico processual que não pode ser imposto por qualquer das partes, deve ser negociado; não atinge terceiros e por isso não pode ser impugnado por terceiros; é personalíssimo e deve exigir autonomia de vontade para sua celebração. “Se estamos falando em negócio jurídico processual, ele é um acordo e, portanto, não vejo obrigatoriedade em celebrá-lo. É claro que o Ministério Público deve se manifestar de maneira fundamentada, se aceita ou não, mas não vejo como um direito subjetivo do acusado”, salientou.
Maria Thereza Moura explanou ainda sobre a aplicação da lei no tempo, com relação à aplicabilidade do acordo aos processos existentes quando a lei entrou em vigência; a natureza da ação penal que pode ser abrangida pelo acordo; os pressupostos objetivos e subjetivos; a exigência de confissão formal e circunstancial; os requisitos de cabimento e as condições para a reparação do dano. Ela lembrou que o acordo deve ser proposto pelo Ministério Público e assinado pelo acusado e por seu advogado e a homologação é da competência do juízo onde tramita o inquérito, podendo o juiz recusar, se a proposta for insuficiente, inadequada ou abusiva.
Em seguida, Rogério Sanches Cunha discorreu sobre aspectos controvertidos relacionados ao acordo de não persecução penal. Ele explicou os pressupostos e as condições para a realização do acordo, bem como os trâmites procedimentais. E enfatizou que o acordo deve observar os mesmos requisitos para o oferecimento da denúncia, de modo que se o princípio da insignificância impede o oferecimento da denúncia, também impede o acordo. “O Ministério Público tem que continuar promovendo o arquivamento por atipicidade material. Não se substitui arquivamento por acordo de não persecução penal, mas o acordo deve ser um filtro para o oferecimento da denúncia”, salientou.
O professor ressaltou que crime culposo com violência, cuja violência não está na conduta, mas no resultado, deve ser passível de acordo de não persecução penal. “Entendo que quando o legislador proibiu o acordo para crime com violência, preocupou-se com a violência na conduta e não no resultado. Logo, acho possível o acordo em crime culposo com violência”, ressaltou. Entre outras questões, dissertou sobre a exigência da confissão e as suas consequências em face da não homologação do acordo.
Na sequência, Pierpaolo Bottini dissertou sobre a colaboração premiada, que sofreu mudanças significativas com o Pacote Anticrime. Ele explicou que o instituto consiste em um pacto entre o cidadão e o Estado, no qual o cidadão renuncia ao direito ao silêncio e ao direito de defesa e apresenta ao Estado não só a confissão, como também uma série de elementos adicionais e em troca tem benefícios. Ele salientou que há uma série de questões a serem resolvidas e explanou sobre pontos polêmicos relacionados aos benefícios, à retroatividade da lei, à rescisão do acordo, às diferenças entre vício de validade e vício de eficácia e os respectivos efeitos sobre os benefícios e as provas apresentadas.
“Se esse pacto e os seus parâmetros não estiverem bem sedimentados, se não houver segurança jurídica na colaboração, ela não será um instrumento que se preste a efetivamente a auxiliar as investigações. A colaboração é um instrumento importante que tem sido fundamental para o desbaratamento de grandes organizações criminosas. Se não forem firmadas algumas questões e superadas algumas polêmicas, esse instrumento deixará de ser utilizado. É importante que esses pontos sejam enfrentados o mais rapidamente pelo Poder Judiciário, que haja uma sedimentação e que as divergências sejam superadas”, ponderou.
Também participaram do evento os desembargadores Fernando Antonio Torres Garcia, conselheiro da Escola; e Hermann Herschander, coordenador do curso; e os juízes Antonio Maria Patiño Zorz, Gláucio Roberto Brittes de Araújo, também coordenador do curso; e Maria Paula Cassone Rossi.
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