Cláusula penal é analisada no curso ‘Temas de inadimplemento contratual’

Nelson Rosenvald ministrou a aula.

 

O tema “Cláusula penal”, foi estudado na aula do último dia 15 do curso Temas de inadimplemento contratual da EPM, com exposição do procurador de Justiça Nelson Rosenvald e participação dos coordenadores do curso, desembargadora Claudia Grieco Tabosa Pessoa e juiz Enéas Costa Garcia.

 

Na abertura, Enéas Garcia salientou que o tema tem repercussões práticas importantes, pois são muitas as questões polêmicas levadas aos tribunais sobre a maneira de se aplicar a cláusula penal.

 

Nelson Rosenvald iniciou a exposição salientando que o Direito das Obrigações foi muito bem orquestrado no Código Civil de 2002, a partir de quatro títulos que dispõem sobre a gênese da relação contratual, suas transformações, a fase do adimplemento e o Título IV, sobre o inadimplemento. Ele lembrou que o inadimplemento é a inobservância de qualquer dever emanado da relação obrigacional. “Quando há a inexecução da relação obrigacional o devedor não recupera sua liberdade, o credor não satisfaz seu interesse objetivo e a obrigação não se extingue de forma natural”, salientou.

 

Ele explicou que o artigo 389 do CC diz, em outras palavras, que o inadimplemento propicia uma alteração do conteúdo do vínculo, sai a obrigação originária de dar, fazer ou não fazer e entra uma obrigação sucessiva, de indenizar. Ele ressaltou que a cláusula penal facilita muito esse processo por ser uma convenção acessória das partes na qual o devedor se compromete a efetuar uma prestação em caso de inexecução. E destacou três características fundamentais da cláusula penal: acessoriedade, consistir em obrigação facultativa e constituir garantia sui generis, porque é uma responsabilidade agravada no patrimônio do próprio credor, uma forma de gestão de riscos.

 

O palestrante observou que a cláusula penal é tradicionalmente dividida em duas espécies: cláusula penal moratória e cláusula penal compensatória e explanou sobre os conceitos, características, circunstâncias de incidência e aplicações de ambas. Ele destacou que a cláusula penal moratória está bem redigida nos artigos 408 a 416 do CC e costuma ser bem tratada pela doutrina e bem aplicada na jurisprudência. “A mora não é sinônimo de atraso, ela tem um critério mais amplo, surge quando o devedor não realiza a prestação no tempo local e forma ajustados. Ela se dá mesmo quando o pagamento é feito em dia, mas por uma forma incorreta. A mora não se contenta com o elemento objetivo da impontualidade, ela também requer o elemento subjetivo da culpa”, esclareceu.

 

Ele acrescentou que a vantagem da cláusula penal moratória é dispensar a prova da existência ou da extensão dos danos. É uma pena privada, uma sanção de caráter punitivo independente de qualquer comprovação de prejuízo. E esclareceu que os juros de mora – que se cumulam à cláusula penal moratória – também constituem uma pena privada e citou os artigos 407 do CC e 292 do Código de Processo Civil que embasam essa tese.

 

Nelson Rosenvald explicou que a cláusula penal compensatória pode ter aplicação a partir do momento da passagem do inadimplemento relativo para o absoluto, quando a prestação não foi e nem poderá ser cumprida (parágrafo único do artigo 395 do CC). “O magistrado deve evidenciar se em determinado tipo de contrato, dentro de determinadas circunstâncias, o credor pode perder seu interesse. Para que a cláusula penal compensatória possa ser aplicada, o artigo 408 do CC exige o elemento da culpa, um elemento essencial de incidência da cláusula penal”, esclareceu.

 

Ele ressaltou que isso é muito importante nesse período de pandemia. “É preciso qualificar o fato jurídico Covid de acordo com a causa de cada negócio jurídico para saber sobre a aplicação ou não de motivo de força maior. Não há como qualificar abstratamente um acontecimento na teoria contratual”, ponderou. E esclareceu que em contratos de execução continuada a Covid pode se manifestar por três eficácias: pode ser um caso de impossibilidade objetiva total e superveniente da prestação, que gera a exoneração do devedor, a resolução do contrato, por romper o nexo causal. E nesse plano pode-se falar em força maior pela necessariedade e inevitabilidade do evento. São os casos de atos normativos que suspenderam as atividades e geraram inviabilidade de cumprimento de prestações.

 

O palestrante explicou que outra eficácia atribuída à Covid ocorre quando não há impossibilidade absoluta objetiva, mas há impossibilidade objetiva relativa de cumprir a prestação, quando há agravamento do sacrifício econômico de uma das partes e surge a onerosidade excessiva. Ou seja, objetivamente a prestação é viável, mas há extrema dificuldade econômica de cumprimento. “Nesses casos, o ordenamento jurídico oferece três alternativas: revisão contratual (artigo 317 do CC), resolução contratual (artigo 478) e a mais recomendada, que é a renegociação extrajudicial, conforme a boa-fé objetiva (artigo 422)”, esclareceu.

 

Nelson Rosenvald acrescentou que a terceira eficácia é proveniente das situações em que não há impossibilidade objetiva da prestação absoluta nem relativa, em que o cumprimento da obrigação não foi abalado, mas é claro que há uma repercussão sistêmica da pandemia sobre a economia que gera situações em que há impossibilidade subjetiva, ou seja, a parte não dispõe de meios para cumprir por ter a capacidade de pagamento reduzida. “São casos em que é importante haver a distinção porque não vai se aplicar a força maior nem o artigo 478 do CC, mas há necessidade de se chamar as partes para uma renegociação, para eventualmente negociarem uma dilação de prazo, suspensão de pagamentos ou outras condições. Isso é muito importante”, frisou.

 

Por fim, explanou sobre a natureza da cláusula penal. “A maior parte dos livros de doutrina dizem que a cláusula penal compensatória é de natureza híbrida, constitui ao mesmo tempo uma indenização e uma pena. Contudo, é impossível ela ser bifuncional, porque a indenização e a pena são incompatíveis, têm natureza opostas”, ponderou, explicando a tese.

 

RF (texto) / Reprodução (imagem)


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