Delação premiada é debatida no curso ‘Temas relevantes de Direito Penal’

Gustavo Badaró foi o expositor.

 

O tema “Delação premiada – prós e contras, limites éticos e legais, análise de casos concretos e posição dos tribunais” foi debatido no dia 21 no curso de extensão universitária Temas relevantes de Direito Penal da EPM, com exposição do professor Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró e participação do juiz Ulisses Augusto Pascolati Junior, coordenador do curso e da área de Direito Penal da EPM.

 

Ao iniciar a exposição, Gustavo Badaró salientou que a finalidade do processo penal é a solução de conflitos com adesão a uma decisão aceita socialmente, bem como legitimar o exercício do poder punitivo estatal. Ele ressaltou que são condições para uma decisão justa juízo de fato e juízo de direito corretos, mediante atividade epistêmica e hermenêutica corretas, respectivamente, bem como o devido processo legal, pois os fins não justificam os meios.

 

Ele esclareceu que na colaboração premiada há medidas que sugerem a sua finalidade epistêmica, como a necessidade de o colaborador premiado dizer a verdade, renunciando ao direito ao silêncio (artigo 4º, parágrafo 14 da Lei nº 12.850/2013) e a regra de haver necessidade de corroboração com outras provas para a condenação e, mais recentemente, para o recebimento da denúncia e de medidas cautelares (parágrafo 16 do mesmo artigo).

 

O professor salientou que a colaboração premiada se justifica em razão da dificuldade ou impossibilidade de se produzirem provas no contexto da criminalidade organizada. E apontou como objetivos do instituto a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas, bem como a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas, a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa, a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais e a localização de eventual vítima com sua integridade física preservada.

 

Gustavo Badaró explicou que os benefícios são dados na colaboração premiada porque, no contexto de criminalidade organizada, seja pelo pacto de silêncio, seja pela característica dos crimes praticados que normalmente são crimes com violência que se voltam contra possíveis testemunhas, pela preocupação em não deixar rastros e atualmente por uma criminalidade informática e por aspectos transnacionais, entre outras características, a atividade probatória é extremamente dificultada. “Muito provavelmente, se não tiver auxílio de alguém de dentro da organização criminosa que rompa esse pacto de silêncio, que dê o início das diretrizes para que os órgãos de persecução penal possam investigar, processar e punir os integrantes da organização criminosa, esta persecução penal estará fadada ao insucesso”, frisou.

 

A seguir, explanou sobre a estrutura normativa da colaboração premiada, os cuidados procedimentais legais, a instrução processual e o seu valor probatório e fez análise do processo penal como modelo epistêmico em contraposição ao modelo decorrente da colaboração premiada. Ele ponderou sobre a ocorrência de um possível retrocesso e injustiça no uso do modelo ora posto, questionando se se trata de evolução ou involução.

 

“Será que não voltamos alguns séculos em que a confissão voltou a ser a rainha das provas e basta alguém confessar para obter a sua pena independentemente de qualquer adjudicação? Esse é um dilema e teremos que calibrar a utilização da colaboração premiada e também dos acordos de não-persecução penal”, observou. Referindo-se ao modelo, acrescentou: “vejam que isso é profundamente injusto e só reforça a seletividade do processo penal. Se o objetivo do acordo de não-persecução era desafogar a Justiça, ele não servirá, porque não cabe no tráfico de drogas por causa da pena e não cabe no roubo por causa da violência. Ele é extremamente eficaz para a criminalidade econômico-financeira, porque, reparando o dano, pega-se metade do tempo de prestação de serviço à comunidade, a pessoa não é processada e não perde a primariedade. Então, a colaboração premiada de um lado e o acordo de não-persecução penal do outro somente reforçarão a seletividade do sistema penal”, ponderou questionando que o uso do instituto da colaboração premiada tem se restringido à criminalidade organizada do colarinho branco e a ausência do seu uso em relação às organizações criminosas de tráfico de drogas, de milícias e de roubos de carga.

 

RF (texto) / Reprodução (imagem)


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