Aspectos jurídicos da herança digital são discutidos em curso da EPM
Tema foi analisado por Livia Teixeira Leal.
Foi realizado ontem ontem (4) o curso Aspectos jurídicos da herança digital da EPM, com exposição da professora Livia Teixeira Leal e coordenação do desembargador Antonio Carlos Mathias Coltro e do juiz Augusto Drummond Lepage.
A abertura dos trabalhos foi feita pelo diretor da Escola, desembargador Luis Francisco Aguilar Cortez, que agradeceu a participação de todos, em especial da palestrante, bem como o trabalho dos coordenadores, enfatizando a importância do debate. “Eventos como esse ajudam a Escola a cumprir a sua missão, não só na formação de novos juízes, mas também na atualização dos magistrados, além de trazer aos servidores e à comunidade jurídica novos temas que certamente virão ao Judiciário”, ressaltou.
O desembargador Antonio Carlos Mathias Coltro agradeceu à direção da Escola pela oportunidade e à palestrante, lembrando que os magistrados têm se defrontado com diversas questões ligadas ao mundo digital que suscitam dúvidas. “Com a exposição de hoje teremos mais condições de examinar e decidir a respeito do tema”, frisou.
Livia Leal observou inicialmente que a questão central a respeito da herança digital é decidir o que fazer com todo o conteúdo disponibilizado pelas pessoas na internet após a sua morte, como músicas, filmes, documentos, e-mails, perfis de redes sociais, livros digitais, fotos e vídeos. Ela mencionou reportagem do Globo que previu que, caso mantido o uso atual, em 2070 o Facebook terá mais perfis de pessoas falecidas do que vivas, além da previsão de alguns autores de que a rede social se tornará um “grande cemitério virtual” nos próximos anos. Acrescentou que já existem empresas especializadas em gerenciar perfis de pessoas falecidas, para apagar as contas ou mantê-las, iniciativas de provedores nesse sentido, aplicativos que utilizam inteligência artificial para “prolongar a existência” do usuário após a sua morte e ações de exploração econômica de perfis de pessoas falecidas.
A palestrante lembrou que o ordenamento jurídico brasileiro em sua maior parte está pautado em uma realidade analógica, não havendo legislação específica sobre a herança digital, e citou alguns projetos de lei sobre o tema. E apresentou uma classificação dos bens digitais feita pela doutrina, para auxiliar no direcionamento jurídico do tema: patrimoniais, como milhas aéreas ou acessórios de videogames; digitais existenciais, como perfis pessoais em redes sociais, com viés autobiográfico; e digitais híbridos, que seriam os perfis monetizados, como os de celebridades.
Ela destacou ainda a transformação da economia de proprietários para uma economia de usuários, citando a professora Everilda Brandão Guilhermina, com novas relações com os bens, com a utilização do compartilhamento de espaços, streaming, Spotify, Uber e outros serviços e seus reflexos no tratamento. Nesse sentido, discutiu as possibilidades de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, do Direito das Sucessões e do sigilo das comunicações nas questões relacionadas à herança digital, além da tutela post mortem dos direitos da personalidade.
Em relação à proteção de dados de pessoas falecidas, salientou que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/18) não traz previsão sobre o tema e que, embora o artigo 7º da LGPD estabeleça a exigência do consentimento do titular como requisito para o tratamento dos dados pessoais, não foi previsto pelo legislador o efeito da morte do titular sobre esse consentimento, deixando dúvidas a respeito da autorização ou não para o operador ou responsável manter o tratamento dos dados pessoais após a morte do usuário ou sobre a possibilidade de transferência dos direitos de proteção desses dados aos familiares após a morte do titular. Por fim, discutiu aspectos processuais, questões relacionadas a criptomoedas e precedentes nacionais e estrangeiros.
MA (texto) / Reprodução (imagem)