Curso ‘Direito e questão racial’ tem aula sobre racismo institucional, estrutural e sistema de Justiça

Wallace Corbo foi o expositor.

 

Os temas “Racismo institucional, estrutural e sistema de Justiça” foram debatidos na sexta-feira (22) no curso Direito e questão racial da EPM, com exposição do professor Wallace Corbo e participação das juízas Camila de Jesus Mello Gonçalves e Flávia Martins de Carvalho, coordenadoras do curso. A gravação da aula pode ser acessada no canal da EPM no YouTube.

 

Inicialmente, Wallace Corbo discorreu sobre como o sistema de Justiça permite dar vazão a determinadas mazelas sociais, como o racismo e o machismo, entre outras. Ele explicou que toda norma precisa ser interpretada, de maneira que é grande a margem de discricionaridade e ela está sempre atrelada aos modelos de pensamento de cada ator social, o que interfere no resultado e nas consequências de cada norma.

 

“Quando olhamos para os procedimentos normalizados, visualizamos algumas barreiras necessárias, mas muitas são artificiais e acabam produzindo efeitos de exclusão e de invisibilização. É nesse sentido que o racismo tem uma relação com as falhas institucionais, porque se ele está na base da sociedade, criará sempre mecanismos pelos quais encontrará um espaço de atuação”, esclareceu e acrescentou que essas “falhas” são anormalidades.

 

O palestrante observou que barreiras procedimentais para a contratação de pessoas negras são criadas por meio de sucessivas exigências. “Existem várias exigências para determinados cargos que são relevantes, mas reiteradamente passamos a exigir pré-requisitos que são exigências normalizadas e que talvez não sejam necessárias”, esclareceu. Ele citou como exemplo o requisito do inglês fluente para a contratação de advogados em escritórios nos quais menos de 5% dos casos exigem o domínio dessa língua. “Tal exigência não é necessária e o curso de inglês pode muito bem ser feito após a contratação”, observou.

 

O professor explicou os conceitos de racismo relacionados à opressão e à dominação de certos grupos e às injustiças de redistribuição e de reconhecimento. Ele esclareceu que tanto a ideia de opressão e dominação quanto a ideia de reconhecimento e redistribuição dão uma percepção sobre as consequências do racismo, quais sejam: negar o desenvolvimento de habilidades, o acesso à democracia, aos bens, ao reconhecimento social e à valorização simbólica do seu status como indivíduo.

 

Wallace Corbo destacou que o racismo é uma estrutura social, daí a ideia de racismo estrutural, o que significa que há uma lógica social de subalternização que perpassa diversos campos da realidade social, categorizados em três setores: ideologia, Economia e Direito. “De um lado, um apagamento epistemológico faz com que o Direito não perceba as perspectivas desses grupos e, de outro lado, o racismo é produzido no Direito por meio do que chamamos discriminação, que é a negação ou a criação de obstáculos para o exercício de direitos políticos, econômicos, sociais e civis por essas populações.

 

Ele ressaltou a importância de rever o funcionamento das instituições no sistema de Justiça, primeiro por meio do letramento racial, o que pode ser feito, por exemplo, por meio de cursos como esse. “É preciso criar mecanismos que permitam que nós, como integrantes do sistema de Justiça, compreendamos os impactos raciais no funcionamento das nossas instituições; quais são os limitadores do combate ao racismo dentro dessas instituições; o que está sendo feito e o que se deixa de fazer; e o que está dificultando uma mudança dos resultados. Talvez não tenhamos essas respostas, mas fazer a pergunta é o primeiro passo. O gabinete dos magistrados compreende a questão racial? Existe uma coesão na minha compreensão sobre determinados assuntos que afetam pessoas negras?”, perquiriu, asseverando que é fundamental refletir sobre o impacto desproporcional que determinadas normas podem ter sobre os grupos sociais.

 

Por fim, Wallace Corbo frisou que resolver o racismo no campo do sistema de Justiça é uma questão jurídica, porque envolve repensar dogmática e organização institucional. “Nós não faremos isso sozinhos, mas precisamos ter essa postura individual e então conseguiremos ultrapassar o sistema de Justiça. Na medida em que o sistema de Justiça consiga dar respostas sistemicamente não discriminatórias isso trará uma transformação imediata para a sociedade. O Direito ocupa uma centralidade inquestionável na forma como a sociedade se relaciona entre si. É importante percebermos onde estamos contribuindo sequencialmente com a produção de efeitos racistas para que nós, não sendo racistas, possamos transformar esses procedimentos e derrubar esses obstáculos”, ponderou.  

 

RF (texto) / Reprodução (imagem)

 


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