‘Encontros de Direito Público’ tem debate sobre políticas públicas de moradia na cidade de São Paulo
Alexandra Fuchs foi a expositora.
O tema “Políticas públicas de moradia na cidade de São Paulo” foi discutido na quarta-feira (8) nos Encontros de Direito Público, com exposição da juíza Alexandra Fuchs de Araujo e mediação do juiz Luis Manuel Fonseca Pires, 3º vice-coordenador do Centro de Apoio aos Juízes da Fazenda Pública (Cajufa) e do evento. A gravação do encontro em breve estará disponível no canal da EPM no YouTube.
Em sua exposição, Alexandra Fuchs apresentou o tema desenvolvido em sua tese de doutorado. Ela observou que analisou pesquisas empíricas desenvolvidas no meio acadêmico e pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que apontam a necessidade de uma tutela mais adequada àqueles que vivem em profunda vulnerabilidade. E lembrou que essas pessoas têm muita dificuldade para acessar a Justiça e não conseguem adquirir imóveis porque não preenchem requisitos como renda mínima, trabalho fixo e vínculo celetista.
Ela esclareceu que o objetivo de sua pesquisa foi investigar a viabilidade de o Poder Judiciário, a partir dos instrumentos disponíveis no sistema jurídico e da perspectiva das políticas públicas existentes para a tutela do direito de moradia, proferir decisões capazes de colaborar para a redução dos conflitos fundiários urbanos.
Alexandra Fuchs ressaltou que de acordo com o censo da população de rua da cidade de São Paulo de 2019, nos últimos 28 anos essa população saltou de quase quatro mil para 24.344 pessoas, um crescimento superior a 500%, segundo dados da Prefeitura. Acrescentou que, de acordo com o Sistema de informações para habitação social na cidade de São Paulo (Habisp/abril de 2016), 445.112 domicílios estão localizados em favelas e 385.080 em loteamentos irregulares.
A respeito do desafio urbanístico e das funções da cidade, observou que as decisões judiciais podem influir na cidade, como uma grande obra de infraestrutura, mas quando se pensa em sustentabilidade urbana e em infraestrutura de modo geral, há vários elementos inter-relacionados, que envolvem funções urbanísticas, da cidadania e de gestão. “Quando uma ação de desapropriação é trazida para o Poder Judiciário, embora não aborde esses elementos explicitamente, o gestor público também tem o dever de buscar a solução que menos impacta na cidade em termos de sustentabilidade urbana”, ponderou.
Em relação à perspectiva do direito material, mencionou duas matrizes da legislação, uma baseada no trabalho do economista e filósofo austríaco Friedrich August von Hayek (1899 - 1992), defensor da ordem liberal e da aplicação da norma abstrata a todos de forma igualitária, e outra no pensamento do filósofo francês François Ewald, que defende a necessidade de observância da norma em um esquema de solidariedade. Ela acrescentou que o filósofo fundamentou as novas práticas do Direito social e uma nova história para o instituto de responsabilidade civil, além de entender as normas em um sentido cambiante. E salientou que o sistema jurídico brasileiro possui normas baseadas nas duas matrizes, que muitas vezes aparecem no processo de forma conflituosa: “o autor apresenta como argumentos normas com base no Direito liberal, enquanto a defesa aponta normas baseadas no princípio da solidariedade e essa compatibilização é bastante complexa”.
Alexandra Fuchs também discorreu sobre os conflitos de racionalidades e sobre a discussão do direito à moradia nos tribunais superiores. Ela observou que realizou um levantamento da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que verificou esse tipo de conflito, sem uma interpretação única.
Ela elucidou que a jurisprudência do STF caminha na direção de garantir o direito à moradia em caso de remoção de população de risco, estabelecendo critérios, como a impossibilidade de presunção do risco e o reconhecimento do dever de recolocação em local apropriado, priorizando-se a contenção do risco, quando possível. “A recolocação poderia afastar os termos da Portaria 131/15 do Sehab, que determina ao poder público pagar auxílio aluguel ao invés da recolocação. O valor não é suficiente para cobrir os custos da moradia e a pessoa acaba ocupando uma área de maior risco em relação àquela da qual foi retirada. Hoje o total de recursos empenhados para esse auxílio é tão alto que inviabiliza outras políticas públicas municipais”, ressaltou.
A expositora discorreu ainda sobre justa indenização, instrumentos de operacionalização de políticas públicas de infraestrutura urbana e de regularização fundiária, tutela de direitos de interesse público e limites da fase de cumprimento de sentença, entre outras questões.
Também participaram do evento as juízas Paula Fernanda de Souza Vasconcelos Navarro e Maria Isabel Romero Rodrigues Henriques coordenadora e 1ª vice-coordenadora do Cajufa e também coordenadoras dos encontros, entre outros magistrados, servidores e outros profissionais.
LS (texto) / Reprodução (imagens)