EPM e Unesco promovem o curso ‘Liberdade de imprensa, democracia e Poder Judiciário’
Diretor da EPM e Guilherme Canela foram os expositores.
Teve início ontem (28) o curso Liberdade de imprensa, democracia e Poder Judiciário, promovido pela EPM e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco). As exposições iniciais foram ministradas pelo diretor da EPM, desembargador Luis Francisco Aguilar Cortez, e pelo chefe da área de Liberdade de Expressão e Segurança de Jornalistas da Unesco, Guilherme Canela de Souza Godoi, que coordena o curso com os juízes Alessandra Lopes Santana de Mello, Luis Manuel Fonseca Pires e Paulo Roberto Fadigas Cesar. A gravação do evento está disponível no canal da EPM no YouTube.
Na abertura dos trabalhos o desembargador Luis Francisco Cortez agradeceu a participação de todos, em especial dos integrantes do Conselho Superior da Magistratura, bem como a parceria da Unesco e o trabalho dos coordenadores. “Esperamos que seja uma parceria duradoura, que propicie muitas atividades conjuntas, porque a Escola tem muito a ganhar com a experiência internacional da Unesco e espero que possamos aproveitar e divulgar para os magistrados e para a comunidade jurídica”, ressaltou.
A juíza Alessandra Lopes Santana de Mello agradeceu o apoio da direção da Escola, a parceria da Unesco e a participação de todos e explicou que a proposta do curso é refletir sobre questões atuais relacionadas à liberdade de imprensa e à liberdade de expressão que reclamam do Judiciário e dos profissionais do Direito atenção e capacitação para enfrentamento. “A pandemia nos aproximou e mostrou que nenhum país ou instituição poderá viver em segurança se todos nós não atingirmos o padrão mínimo de dignidade, de informação, de desenvolvimento e de conhecimento científico”, frisou.
Guilherme Canela manifestou a satisfação pela parceria com a EPM e recordou que a Unesco iniciou em 2013 a Iniciativa de Juízes em relação às temáticas da liberdade de expressão, acesso à informação pública e segurança de jornalistas, que já envolveu mais de 23 mil profissionais judiciais, a maioria magistrados e promotores de Justiça, de 150 países. “Isso demonstra o interesse global e crescente dos operadores judiciais nessa agenda, que é cada vez mais complexa, porque o advento das novas tecnologias traz desafios para todos os envolvidos na proteção e na promoção da liberdade de expressão, sobretudo para os operadores judiciais, porque não é trivial tomar decisões e implementar os princípios previstos no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos”. Ele também destacou o aumento da transparência, informando que há 30 anos só havia doze países com leis sobre acesso a informação pública e hoje 135 países têm legislações nesse sentido.
O desembargador Antonio Carlos Villen, representando o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, ressaltou a relevância do curso, frisando será enriquecedor para todos. “A liberdade de imprensa sempre foi tema fundamental para a constituição e sobrevivência dos regimes democráticos e hoje essa importância recrudesce, porque é impossível discutir a liberdade de imprensa sem discutir a liberdade de expressão e o exercício desse direito fundamental diante da crise da democracia em vários países e de alguns efeitos deletérios da utilização da internet e das redes sociais ao regime democrático. Temos que trabalhar para reduzir esses efeitos nocivos para que prevaleçam apenas os efeitos positivos desses novos meios de exercício da liberdade de expressão”, asseverou.
O corregedor-geral da Justiça, desembargador Ricardo Mair Anafe, também enfatizou a importância do curso, em especial no momento histórico mundial. “A liberdade de imprensa, a democracia e o Poder Judiciário são pilares fundamentais. A democracia sobrevive pela liberdade do direito de escolha, pelo exercício pleno da cidadania e para que isso se suceda há necessidade de uma imprensa forte, que tenha condições de trazer a informação a todos. O Poder Judiciário é o garantidor desse exercício e do Estado Democrático de Direito e isso os juízes fazem no exercício da jurisdição, com coragem e responsabilidade. A informação é de suma importância, bem como o viés da liberdade de expressão e da segurança dos jornalistas”, salientou, parabenizando a direção da Escola, a Unesco e os coordenadores pela realização do curso.
O vice-presidente do TJSP, desembargador Luis Soares de Mello, destacou a eficiência da EPM durante a pandemia frisando que ela é o exemplo de que as atividades virtuais funcionam, assim como o Tribunal de Justiça. “A liberdade de imprensa é a base de uma nação democrática, é o sustentáculo da própria liberdade individual do cidadão, porque é por meio da imprensa que atingimos todo o arcabouço de conhecimento e de cultura que temos e o Judiciário exerce esse papel de defensor da liberdade de imprensa”, frisou.
Exposições
Iniciando as exposições, Guilherme Canela discorreu sobre o tema “A liberdade de expressão nos sistemas Universal e Interamericano de Direitos Humanos”. Ele lembrou que a liberdade de expressão está ligada a uma série de outros direitos e tem muitas ramificações, entre elas a liberdade de imprensa, tem contornos coletivos, mas também está relacionada às experiências individuais. “A liberdade de expressão é algo que nos define como seres humanos e tem uma importância fundamental, inclusive na construção da linguagem”, frisou, ponderando que isso explica por que o direito recebeu uma proteção tão especial no Sistema Universal de Direitos Humanos.
Ele recordou que a liberdade de expressão teve uma construção complicada ao longo da história, muitas vezes fundamentada pela atuação de personagens que sofreram com o cerceamento desse direito, mas que deram origem aos grandes discursos e à elaboração teórica sobre o tema, culminando com o Sistema Universal de Direitos Humanos. Ressaltou ainda que o artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos continua atual e estabelece que todos têm o direito de direito de falar, mas também de investigar e receber informações e de divulgá-las, por qualquer meio de expressão. Em relação às suas limitações, esclareceu que os únicos discursos não protegidos por esse direito, segundo o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, são a propaganda em favor da guerra e a apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, hostilidade ou violência. E destacou a função tripla da liberdade de expressão: realização do ser humano, exercício de outros direitos e garantia de existência dos regimes democráticos.
Na sequência, Luis Francisco Cortez fez uma exposição sobre o tema “Judiciário e a liberdade imprensa: desafios atuais”. Ele recordou que o Estado constitucional tem instrumentos para evitar a excessiva concentração do poder e seu exercício abusivo, mas são insuficientes e se complementam com a liberdade de imprensa e de expressão, que são controles exercidos pela sociedade. Ele explanou sobre o tratamento normativo e sobre as limitações à liberdade de expressão no Brasil e em outros países, lembrando que o Direito incorpora tratados internacionais que dão parâmetros para o que pode ser objeto de acompanhamento pelo poder público e o que deve ser absolutamente preservado, e destacou os artigos 5º, incisos IV, VI e IX, e 220 da Constituição Federal. Em relação ao aparente conflito com os direitos da personalidade, ponderou que essa preocupação deve ser vinculada a outros princípios constitucionais, como o democrático, o republicano e o acesso à informação, e que deve ser aplicada a regra de proporcionalidade, lembrando que o Judiciário busca equilibrar desses pontos.
Por fim, discorreu sobre os desafios diante da potencialização da comunicação pelas novas tecnologias, no caso da imprensa, a questão mercadológica e a dificuldade para manter a objetividade e proporcionalidade, e para o Judiciário a dificuldade para discernir os limites entre o que é liberdade e o que coloca em risco as liberdades, tendo como foco que a liberdade de expressão é um valor especial, que merece proteção especial e que seu exercício deve preservar as outras liberdades. “Parece urgente que as instituições sejam reformuladas, para que sejam mais inclusivas, e que a concepção da prestação jurisdicional seja mais pública. Para isso a imprensa deve continuar buscando a objetividade e a verdade e o Judiciário não deve disputar espaço com a ‘pequena política’, mas se preocupar com a política institucional, que visa preservar a democracia e as liberdades”, concluiu.
MA (texto) / Reprodução (imagens)