Ciclo de palestras sobre as principais alterações na LINDB promovidas pela Lei nº 13.655/18 e seus reflexos no Direito Público é concluído

Pedro Moniz Lopes foi o palestrante.

Com um debate sobre o tema “Princípio da boa-fé e seus impactos nos contratos e decisões administrativas” foi encerrado na sexta-feira (22) o ciclo de palestras Principais alterações na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) promovidas pela Lei nº 13.655/18 e seus reflexos no Direito Público, promovido pela EPM e pela Fundação Arcadas. A exposição foi ministrada pelo professor Pedro Moniz Lopes, da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. O evento teve a participação dos desembargadores Luis Francisco Aguilar Cortez, diretor da EPM; Antonio Carlos Villen, coordenador do ciclo; e Luciana Almeida Prado Bresciani, conselheira da EPM, que presidiu o encontro; e do juiz Alexandre Dartanhan de Mello Guerra, também coordenador do ciclo.

Pedro Lopes explicou inicialmente a sua visão acerca da diferenciação estrutural entre regras e princípios, segundo a qual as regras regulam condutas e situações específicas e por isso agregam muita força no sentido argumentativo de serem definitivas, enquanto os princípios regulam condutas genéricas e por isso perdem densidade ao ter o seu âmbito de aplicação alargado para várias condutas e ações. Ele acrescentou que disso decorre que as regras conflitam entre si apenas incidentalmente, enquanto os princípios, independentemente de serem constitucionais ou legais, são normas que tendem a conflitar porque o leque de condutas que cobrem é muito amplo. 

Ao distinguir os princípios das normas, observou que nos últimos 30 anos há um movimento de quase obsessão pelos princípios e ponderou que é preciso recentrar a importância das regras porque elas são fundamentais para a segurança jurídica. Ele frisou que a limitação do ativismo, não apenas judicial, decisório, mas de qualquer um dos poderes constituídos, é necessária porque o Direito tem por base a segurança, a padronização, a criação de expectativas e o respeito pelas expectativas. “É muito importante para uma sociedade poder se coordenar. As investigações da neurociência dizem que as magníficas descobertas de Darwin a respeito da sobrevivência do mais competitivo e do mais apto já não são tão atuais. Diz-se agora que sobrevive aquele que melhor consegue cooperar e coordenar-se com os demais. Portanto a importância das regras é grande porque permite criar essa padronização e essa certeza para que possamos nos entender”, ressaltou.
 
O professor explicou que quando os princípios conflituam entre si, realiza-se a atividade de ponderação, em que existe maior discricionaridade e portanto maior subjetivismo. Ele dissertou sobre os mecanismos e fórmulas de ponderação, segundo o nível de interferência de um princípio no outro e pelo qual quanto maior essa interferência, entende-se que maior é a importância de salvaguardar o princípio que sofre a interferência. Ele criticou esse sistema porque se faz necessário analisar também o grau de certeza ou de convicção acerca dessa interferência. E ressaltou que quanto maior a interferência de um princípio no outro, maiores devem ser as certezas que se precisa ter das razões dessa interferência, dessas suposições de fato. 

“Isso é simples de compreender no que diz respeito à vacinação em geral. Nos planos nacionais há vacinação obrigatória e vacinação facultativa. A lei entende que a vacinação é uma interferência na entidade física e portanto só podem ser obrigatórias ou constarem do plano de vacinação – mesmo que não sejam obrigatórias – aquelas vacinas cuja terapêutica tenha um grau de certeza científico elevado. Se existir uma vacina que pode ou não resolver ou prevenir aquela doença, então não há tantas razões para torná-la obrigatória ou integrá-la no plano nacional de vacinação, porque não há grau de certeza suficiente para saber que ela criará imunidade. Essa questão é absolutamente fundamental no âmbito da fórmula para resolver os conflitos entre princípios. Não é só o grau de interferência que conta, não é só a lei substantiva”, ponderou. 

Pedro Lopes explicou que se em determinado caso se entender que o princípio da igualdade interferirá muito no princípio da boa-fé, isso não quer dizer que o princípio da boa-fé deve prevalecer, porque o juiz pode ter uma certeza muito fraca de uma interferência muito forte e uma certeza muito forte de uma interferência muito fraca. “Se considerarmos apenas a dimensão ontológica ou substantiva dos princípios, não levamos em conta um aspecto tão importante que é o grau de certeza da prognose, a certeza que tenho que isso irá acontecer. Um dos grandes desafios que se coloca hoje em dia à teoria dos princípios e à teorização da ponderação é desenvolver um sistema viável dos graus de certeza para fornecer à magistratura e ao Judiciário elementos a respeito no nível necessário de certeza para se chegar a uma conclusão. A prevalência de um princípio sobre o outro está relacionada com o nível de certeza da interferência, não apenas com a intensidade da interferência”, ressaltou. 

Ele esclareceu que mesmo que a prevalência de um princípio crie uma consequência devastadora, se o risco dessa consequência ocorrer for ínfimo, não é racional uma decisão dar prevalência a esse princípio porque sacrificará outro princípio em que a consequência não é tão devastadora, mas o risco de verificação é muito maior. “Esse é o enquadramento do funcionamento dos princípios que se aplicam mais por ponderação do que propriamente por subsunção”, ponderou.

Pedro Lopes salientou ainda que os princípios não devem ser confundidos, pois cada um tem a sua razão de ser e é preciso distinguir a boa-fé dos demais princípios. Do contrário, tenta-se aplicá-lo para tudo, o que contribui para descaracterizar o princípio que serve não para proclamar, mas para regular condutas. “Se é para regular condutas, o princípio da boa-fé é não só para o juiz aplicar em face de controle, mas para o decisor aplicar em face de prevenção, não violar a boa-fé”, salientou. Por fim, explanou sobre a aplicação do princípio da boa-fé nas decisões administrativas e nos contratos administrativos.

RF (texto) / Reprodução (imagem)


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