Práticas “predatórias” no ajuizamento de ações de consumo são debatidas no Núcleo de Estudos em Direito do Consumidor

Carla Germano foi a expositora.

Os temas “Práticas ‘predatórias’ no ajuizamento de ações de consumo: abuso do direito de ação; deslealdade processual com mecanismos fraudulentos; e diferença entre ‘ações predatórias’ e ‘ações repetitivas’”, foram discutidos na reunião de hoje (27) do Núcleo de Estudos em Direito do Consumidor da EPM. A exposição foi feita pela juíza Carla Themis Lagrotta Germano, com mediação do desembargador Sérgio Seiji Shimura e do juiz Alexandre David Malfatti, coordenadores do núcleo.

Carla Germano iniciou a exposição lembrando que o direito de ação é uma garantia fundamental prevista na Constituição Federal que determina que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Entretanto, ela lembrou outras garantias fundamentais previstas na Constituição, como a defesa do consumidor, a assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência financeira, o contraditório e a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes e a garantia, no âmbito judicial e administrativo, à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade processual. Ela ressaltou que esse rol de garantias é a base do Estado Democrático de Direito porque estabelece o sistema pelo qual as pessoas têm a liberdade de reivindicar os seus direitos e resolver seus conflitos.

A expositora ressaltou que o direito de ação está intimamente ligado à boa-fé, à ética, à lealdade, à probidade e à prudência, sempre no espírito de cooperação como previsto no artigo 6º do Código de Processo Civil: “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Ela acrescentou que se a parte não agir dessa maneira incorrerá em abuso do direito de ação, nos termos do artigo 187 do Código Civil: “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.

Carla Germano salientou que a boa-fé é inerente ao ser humano ou deveria ser. “Ser honesto é a regra, a exceção é a desonestidade. A boa-fé é a regra, a exceção é a má-fé. Quem age com má-fé, com intuito de enganar, de não corresponder à verdade e de não demonstrar de forma honesta os fatos não tem o comportamento adequado ao nosso sistema processual”, analisou. E acrescentou que a deslealdade processual também pode se configurar pela dedução da pretensão ou defesa contrária a texto expresso de lei, que é um comportamento temerário em qualquer incidente ou ato do processo. “O processo é um instrumento colocado à disposição das partes não apenas para solucionar os seus conflitos, mas também para a pacificação social. Uma sociedade que tenha conflito busca no Poder Judiciário a solução e isso é uma segurança ao bem-estar social. O fato de alguém buscar o direito que acredita ter não o autoriza a usar de maneira temerária meios para enganar e alcançar esse direito”, ponderou. 

Ela ressaltou que a má-fé e o desrespeito à lealdade processual refletem na esfera jurídica da outra parte, prejudicando-a. E para compensar esse prejuízo há a previsão da condenação às penas da litigância de má-fé, no CPC, conforme artigos 79 a 81, que tratam da responsabilidade das partes por dano processual. Ela salientou que são bem abertas algumas condutas descritas no rol do artigo 80 do CPC, como usar do processo para conseguir objetivo ilegal e proceder de modo temerário em incidente ou ato do processo. Questionou o fato de ser considerado meramente exercício do direito de ação a interposição indevida de todos os recursos disponíveis no sistema. E afirmou que as condenações, baseadas no valor da causa, muitas vezes são ínfimas e inócuas. 

“Não podemos esquecer que temos como garantia fundamental a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Precisamos pensar qual é o direito fundamental principal. Buscar o direito usando todos os recursos ou saber que é preciso ter lealdade processual, que também é uma garantia processual?”, questionou Carla Germano. E ponderou que não pode ser permitido o abuso que fere essa garantia e prejudica o jurisdicionado. “Prejudica não só o jurisdicionado como todo o sistema de Justiça. Até que ponto o acúmulo de recursos é para garantir o acesso de um determinado indivíduo em detrimento dos demais que buscam o Judiciário? Será que no Judiciário falta tanta estrutura assim ou ele não dá conta desse tipo de comportamento? Esses danos causados ao Judiciário refletem na sociedade em geral e quem paga esse dano social?”, ponderou.  

RF (texto) / Reprodução (imagem)


O Tribunal de Justiça de São Paulo utiliza cookies, armazenados apenas em caráter temporário, a fim de obter estatísticas para aprimorar a experiência do usuário. A navegação no portal implica concordância com esse procedimento, em linha com a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais do TJSP