Questões polêmicas dos contratos bancários são discutidas no curso de Direito Civil Patrimonial
Exposição foi ministrada por Spencer Ferreira.
O tema “Mútuo de dinheiro – questões polêmicas dos contratos bancários” foi estudado na aula de quinta-feira (2) do 2º Curso de especialização em Direito Civil Patrimonial da EPM, com exposição do desembargador Spencer Almeida Ferreira e a participação da desembargadora Claudia Grieco Tabosa Pessoa, coordenadora do curso.
Spencer Ferreira salientou inicialmente que mútuo bancário é um tema de bastante interesse, especialmente em função da polêmica criada na ausência de legislação própria. “Muitas questões são resolvidas por meio da jurisprudência, que vai sendo sedimentada e muitas vezes consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça”.
Ele recordou que a Constituição Federal, no artigo 192, estabelece que o sistema financeiro deve ser estruturado de maneira a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade, abrangendo as cooperativas de crédito e precisa ser regulado por leis complementares. E lembrou que muitas medidas provisórias têm sido utilizadas como forma de regulação do sistema financeiro.
O expositor ressaltou a importância de compreender a composição do sistema financeiro nacional para julgar ou estudar questões bancárias. Observou que embora em muitas petições e recursos exista o argumento de que não há lei, portaria ou resolução que represente força cogente para cumprir alguma determinação, a Lei nº 4.595/64, conhecida como Lei da Reforma do Sistema Bancário, estabelece em seu artigo 1º que o sistema nacional é constituído pelo Conselho Monetário Nacional, Banco Central do Brasil, Banco do Brasil, Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e demais instituições públicas e privadas. “Interessante salientar que as decisões do Conselho Monetário Nacional são publicadas por meio do Banco Central. De forma prática, podemos entender que o Banco Central é a voz do Conselho Monetário Nacional, portanto, ao regular o sistema financeiro, faz sempre com autorização deste Conselho”, esclareceu.
A respeito dos princípios relevantes aplicáveis ao mútuo de dinheiro nos contratos bancários, citou a autonomia da vontade, a boa-fé objetiva (amparada nos artigos 113, 187 e 422 do Código Civil e nos artigos 4º, III e 51, IV do Código de Defesa do Consumidor), a vulnerabilidade do consumidor, a liberdade de forma e o equilíbrio ou equivalência material, entre outros.
Spencer Ferreira definiu mútuo como empréstimo para consumo, a entrega de coisa fungível (citando o artigo 85 do Código Civil) para aquele que a consuma, devolvendo-a no tempo acordado, no mesmo gênero, quantidade e qualidade. Explicou que pode ser oneroso e mencionou o conceito res periti domino, que significa que a coisa perece para o mutuário, que passa a ser proprietário. A respeito das características do mútuo, mencionou o contrato real e explicou que ele se aperfeiçoa com a entrega da coisa (que compõe a essência do mútuo), citando o artigo 586 do Código Civil. Também citou o contrato unilateral, explicando que a partir da entrega da coisa, as obrigações são do mutuário (devolvê-la no prazo acordado e, se for caso, com pagamento dos juros convencionados). Ele acrescentou que o contrato se aperfeiçoa com a entrega da coisa mutuada ou com o crédito na conta do mutuário (mútuo bancário).
Spencer Ferreira discorreu a seguir sobre a Lei do Superendividamento (Lei nº 14.181/21), vigente desde 2 de julho de 2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03). Ele lembrou que até o surgimento da lei, a questão já vinha sendo analisada pelo Tribunal de Justiça e pelo STJ. Ele definiu superendividamento como a impossibilidade total de o consumidor pessoa física, devedor, leigo e de boa-fé pagar suas dívidas atuais e futuras, decorrentes do consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial.
O palestrante esclareceu que a lei instituiu um instrumento de renegociação em bloco das dívidas nos tribunais estaduais e em órgãos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (Procon, Ministério Público e Defensoria Pública). Entre as dívidas que podem ser negociadas, citou as dívidas de consumo; contas de água, luz, gás e telefone; empréstimos com bancos e financeiras, inclusive cheque especial e cartão de crédito; crediários e parcelamentos. Explicou que não podem ser negociados impostos e tributos, pensão alimentícia, contrato de crédito com garantia real, crédito rural, financiamento imobiliário, produtos e serviços de luxo e contratos celebrados dolosamente, sem o propósito de realizar pagamentos.
O expositor também discorreu sobre as espécies de mútuos, encargos financeiros e aplicação no CDC, questões polêmicas envolvendo crédito consignado e abusividade dos juros, entre outras.
LS (texto) / Reprodução (imagem)