Perspectiva do Direito Comparado sobre as relações sexuais consentidas entre adolescentes é apresentada em curso da EPM

Eduardo Rezende Melo foi o expositor.

A EPM realizou ontem (28) o curso on-line Aquém da idade de consentimento: relações sexuais consentidas entre adolescentes e a Justiça Juvenil – lições do Direito Comparado, com exposição do juiz Eduardo Rezende Melo.

A abertura dos trabalhos foi feita pelo diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, que agradeceu a participação de todos e o trabalho dos coordenadores do curso e da área de Infância e Juventude da Escola, desembargador Eduardo Cortez de Freitas Gouvêa e juiz Eduardo Melo. Ele ressaltou que o sucesso do evento, com mais de 700 inscritos, “demonstra a excelência dos temas e das exposições que a Coordenadoria tem levado à discussão dos profissionais do Direito, em uma área tão sensível e importante, trazendo tantos frutos para o Judiciário, jurisdicionados e sociedade em geral”, acrescentando que a Coordenadoria organizou duas edições dos dos Cadernos Jurídicos em 2023 e em breve lançará nova edição, com o tema “Temas fundamentais da Justiça Juvenil – perspectiva pautada em direitos e os dilemas e desafios para a proteção integral”.

Eduardo Melo salientou inicialmente o objetivo do curso de debater os limites da tutela penal em relação aos direitos sexuais na infância e juventude, com ênfase na exclusão da tipicidade nas relações consentidas entre adolescentes. Esclareceu que o estudo apresentado no curso foi encomendado pelo Fórum Nacional da Justiça Juvenil e tem o objetivo de traçar possibilidades analíticas e interpretativas que favoreçam tanto a promoção de direitos fundamentais de crianças e adolescentes, como sua proteção em relação a desníveis de poder, abuso e exploração.

Ele explicou que devido à criação do tipo penal de estupro de vulnerável e a edição da Súmula 593 do Superior Tribunal de Justiça quanto à irrelevância do consentimento da vítima para o ato sexual, surgiram dilemas em torno do tratamento jurídico das práticas sexuais consentidas entre adolescentes. “A idade de consentimento prevista no Código Penal é 14 anos e a idade mínima para adolescentes serem sujeitos de ação de apuração de ato infracional e de imposição de medida socioeducativa é 12 anos. Se houver uma relação sexual consentida dentro desse lapso temporal dos 12 aos 14 anos, como o Direito responde a isso?”, indagou.

O expositor observou que, ainda que de maneira tímida, tanto a doutrina como a jurisprudência têm invocado a experiência de outros países, em especial a norte-americana, para fundamentar o reconhecimento da cláusula excludente da tipicidade nesses contextos, com base na exceção de Romeu e Julieta. Ele afirmou que alterações nas legislações estrangeiras em torno da idade de consentimento expressam o deslocamento do enfoque do controle da sexualidade juvenil para enfatizar a proteção contra a exploração e não da vulnerabilidade como expressão da inocência da criança e do adolescente. “Estão em jogo dinâmicas de poder que incidem nas relações sexuais com crianças e adolescentes e que, comprometendo sua capacidade de escolha em fase de amadurecimento, ferem sua dignidade”, ponderou.

Eduardo Melo apresentou dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Ministério da Saúde em 2019, que indicam uma redução das médias etárias de iniciação sexual: 13,4 anos para os meninos e 14,2 anos para as meninas. Ele ponderou que a perspectiva meramente de controle penal tem dificultado, senão obstado crianças e adolescentes a terem garantidos outros direitos, gerando colisão e a necessidade de uma abordagem holística, pautada em direitos fundamentais de crianças e adolescentes, para uma adequada interpretação legal.

O palestrante destacou também os impactos da legislação na área da saúde: “o tratamento penal da questão gera dilemas éticos para médicos e profissionais da saúde, que têm a obrigação de notificar situações caracterizadas legalmente como violência, embora os adolescentes não a vivam como tal”. 

Em relação à área da educação, recordou que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a decisão de não oferecer educação para a sexualidade nas escolas é uma forma omissiva de educação sexual, que deixa crianças e adolescentes à própria sorte, geralmente negativa. Também favorece o prevalecimento de currículo oculto, com potencial sobrecarga de preconceitos e inadequações, sem possibilidade de controle ou crítica social ou familiar. “A educação sexual deve ser obrigatória, disponível a todos, sem discriminação, desde os primeiros estágios da vida, pautada numa perspectiva holística, científica e pluralista”, ponderou.

Eduardo Melo apresentou um quadro analítico sobre o tema nos continentes europeu, americano e africano, indicando uma tendência de diferenciação entre a idade de consentimento para a relação sexual com adultos, protegendo crianças e adolescentes de abuso e exploração, e a definição de outros critérios para analisar as relações entre adolescentes, procurando afastar as relações consentidas entre adolescentes de idades, contextos socioculturais e econômicos assemelhados da tutela penal.

LS (texto) / Reprodução (imagem)


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