Enfrentamento da litigância predatória é discutida no Gade 9 de Julho em evento para magistrados e assistentes
Gilson Miranda e Fábio Tabosa foram os expositores.
A EPM e a Corregedoria Geral da Justiça realizaram nessa sexta-feira (19) no Gade 9 de Julho o curso Poderes do juiz em face da litigância predatória, com exposições dos desembargadores Gilson Delgado Miranda, diretor da EPM, e Fábio Guidi Tabosa Pessoa, coordenador da área de Direito Processual Civil da Escola. O objetivo foi delimitar tecnicamente a litigância predatória e debater medidas de enfrentamento do uso abusivo do Poder Judiciário, com base nos dados e nas boas práticas divulgadas pelo Núcleo de Monitoramento de Perfis de Demandas (Numopede) da Corregedoria. Direcionado a magistrados e assistentes jurídicos e judiciários, o curso teve 571 inscritos nas modalidades presencial e on-line, sendo 309 magistrados, em 100 comarcas.
O corregedor-geral da Justiça, desembargador Francisco Eduardo Loureiro, coordenador do curso, agradeceu a participação de todos e enfatizou a importância do tema para o Judiciário, frisando o objetivo de discutir o tratamento dogmático conceitual da litigância predatória, em especial os efeitos processuais ou sanções a serem aplicadas. Ressaltou que o evento é apenas o início do debate sobre o tema e que os magistrados inscritos poderão formular propostas de enunciados, que serão discutidas no próximo encontro.
Também compuseram a mesa o presidente da Seção de Direito Privado, desembargador Heraldo de Oliveira Silva, e a desembargadora Marcia Regina Dalla Déa Barone, coordenadora do Gade 9 de Julho.
O desembargador Gilson Miranda salientou o interesse despertado pelo evento entre os magistrados e lembrou que a litigância predatória se tornou um dos principais gargalos do Judiciário brasileiro, por abuso de pequena parcela da advocacia, que causa enorme entrave para a distribuição da justiça, ao aumentar a morosidade e os gastos do Judiciário, e pode levar ao colapso do sistema. Esclareceu que ela está associada a demandas massificadas em que há elementos de abusividade ou fraude, cujos indícios são a mercantilização da advocacia, por meio de captação de clientela ou agenciamento de causas; a fabricação de lides artificiais, sem pretensão resistida ou autorização da parte ou mediante fragmentação da pretensão; o uso de mecanismos ilícitos como violação de dados pessoais, omissão de informações, falsificação de documentos e litigância de má-fé); e a intenção fraudulenta.
Em relação às características da litigância predatória, esclareceu que são processos cíveis, ajuizados por pessoas físicas litigantes eventuais contra empresas e instituições financeiras que são grandes litigantes, patrocinados por poucos advogados e escritórios, com petições iniciais genéricas e em curto espaço de tempo, pedidos mal instruídos de gratuidade da Justiça, procurações e documentos questionáveis. Ele ressaltou que a caracterização desse tipo de litigância demanda estudos, análises de dados e investimentos em jurimetria e destacou, entre as medidas para enfrentamento do problema, a criação do Numopede, em 2016, e do Centro de Inteligência, em 2021, no Tribunal de Justiça de São Paulo; e da Rede de Informações sobre a Litigância Predatória, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2022. Para a contenção da litigância, sugeriu medidas para confirmação da contratação, o julgamento da causa, atingindo o regime financeiro, em itens como a assistência judiciária, valores de dano moral e sucumbência, e a comunicação colaborativa entre os magistrados.
Na sequência, o desembargador Fábio Tabosa analisou aspectos processuais da litigância predatória, bem como seus impactos e possíveis soluções, ponderando que em muitos casos é difícil achar soluções padronizadas, em razão da diversidade e das nuances relacionadas a cada hipótese. Ele ponderou que, embora na maioria dos casos a litigância predatória seja caracterizada pela existência de litígios de massa, que são os casos de maior gravidade, há a litigância predatória “diluída”, que muitas vezes se vale dos mesmos expedientes daquela de larga escala e geralmente pode ser enfrentada com os mesmos instrumentos. Apontou também aspectos que podem identificar esse tipo de litigância, como o pedido de gratuidade indiscriminado, indevido ou não justificado, conjugado a outros, relacionados à conduta do advogado no momento pré-processual, captação da clientela, formação do grupo de litigantes, maneira de ajuizamento e outros procedimentos ao longo do litígio.
Ele lembrou que a litigância predatória é uma tentativa de manipulação ou utilização distorcida dos serviços judiciários para a obtenção de um ganho sem causa e enfatizou a importância da monitoração das demandas para identificar atuações suspeitas ou atípicas e possibilitar uma investigação mais aprofundada. Ele destacou a relevância de núcleos como o Numopede, diante da impossibilidade de realização desse controle por parte dos juízes individualmente, e a importância da atenção dos magistrados às divulgações e orientações do núcleo, para a conscientização e sugestão de abordagens do problema. Por fim, elencou medidas aplicáveis pelo magistrado quando há indícios de litigância predatória, como a exigência de reconhecimento de firma, de certificado digital para procurações assinadas eletronicamente, comparecimento da parte ou outras diligências para comprovar a sua existência ou a intenção de litigar; a declinação da competência, quando o foro não tem vinculação com os elementos da causa; e o reconhecimento da tentativa de sonegação de informações, além do uso de dispositivos previstos no Código de Processo Civil.
MA (texto) / PS (fotos)