Guarda compartilhada em contexto de violência doméstica ou familiar é discutida na EPM
Silvia Felipe Marzagão foi a expositora.
A EPM realizou na sexta-feira (28) a palestra Violência doméstica ou familiar e guarda compartilhada – os desafios da Lei nº 14.713/23, com exposição da advogada Silvia Felipe Marzagão, presidente da Comissão de Família e Sucessões da Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo (OAB SP). O curso teve 761 inscritos, abrangendo 127 comarcas e 19 estados.
A abertura foi feita pelo diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, que agradeceu a participação de todos, em especial da palestrante, e o trabalho dos coordenadores do curso, desembargadora Daniela Maria Cilento Morsello e juiz Augusto Drummond Lepage. Ele destacou o sucesso do curso e a ampliação do acesso ao público externo, com a participação de magistrados, servidores e outros profissionais de outros estados. ”A ideia é a eficiência do serviço público, com a participação de outros operadores do Direito, em um ambiente de excelência, com aulas significativas, como teremos hoje”, frisou.
Silvia Marzagão salientou inicialmente que, embora a alteração legislativa seja recente, os problemas relacionados à guarda compartilhada não são novidade. “A situação é bastante complexa, especialmente pelo fato de termos uma construção das discussões de guarda muito intrínseca com a nossa realidade social”, observou. Ela lembrou que no sistema jurídico vigente sobre guarda e de convivência, há igualdade entre homens e mulheres, com ausência de hierarquia entre pais e mães, de maneira que ambos os pais, independentemente da questão de gênero, terão a possibilidade de acesso e a obrigação de terem cuidado com relação aos seus filhos. “Estamos vivendo uma mudança de paradigmas parentais, relacionais e de gênero e há cada vez mais um questionamento da questão de gênero e a incorporação dessas questões no nosso dia a dia”, ressaltou.
Entretanto, ponderou que há uma discrepância significativa nas disputas de guarda, que também existia durante o período de vida comum dos pais. “Na grande maioria das vezes, quem cuida da criança é a mãe sozinha, ainda que esteja num relacionamento, casada, em união estável ou com contato frequente com o pai daquela criança. Essa reprodução de cuidado que existia durante a vida comum acontece depois e na pós ruptura. E não há política pública com relação a isso, nem a construção de um ensinamento de que o cuidado não está atrelado necessariamente ao gênero e precisa ser dividido com corresponsabilidade”, asseverou.
A professora explicou que o compartilhamento de guarda e de cuidado é a regra e que a guarda unilateral é a exceção, para os casos em que o pai ou a mãe motivadamente abra mão do exercício da guarda ou, conforme estabelecido pela Lei nº 14.713/23, “quando houver elementos que evidenciem a probabilidade de risco de violência doméstica ou familiar”.
Silvia Marzagão questionou se a alteração legislativa teve como intenção alterar a sistemática de compartilhamento como regra, bem como de mudar a presunção, atribuída como verdadeira à palavra da mulher, quando ela aponta a existência de uma violência, fazendo com que ela seja necessariamente, imediatamente estendida aos filhos.
Quanto à necessidade de inclusão do texto legislativo no Código Civil com relação à violência, afirmou que havia elementos anteriores à lei para afastar o compartilhamento em situação de violência. “Esse posicionamento é contrário à nossa sistemática jurídica e a legislação precisa ser interpretada dentro da sistemática que nós temos. Se há alguma situação de conjugalidade que implique em dano à parentalidade, ela precisa ser levada em consideração, mas via de regra, precisamos tentar separar as questões”, ponderou, acrescentando que é preciso analisar o impacto dessas questões na criança ou adolescente, o que é feito por meio de uma prova pericial.
A expositora enfatizou a necessidade de tratar a excepção legislativa como exceção, ponderando que o cenário é complexo, mas houve uma mudança considerável, após a edição da Lei nº 13.058/2014 (Lei da Guarda Compartilhada). Nesse sentido, apontou dados do IBGE sobre guarda de filhos: “em 2014, quando a lei foi promulgada, 85% das guardas eram unilaterais e, em 2020, eram 57%, então houve uma melhora com relação a esses números e acho que não podemos deixar isso retroceder”.
Por fim, Silvia Marzagão frisou a importância do uso e da conscientização sobre o termo convívio nas relações com os filhos. “Conviver é muito diferente de visitar. É participar das atividades, é cuidar de um filho com deficiência, é o filho ter uma casa também na casa do outro. Não há nenhum tipo de dificuldade em fazer esse exercício conjunto e as crianças se adaptam a uma nova rotina”, concluiu.
MA (texto) / MB (fotos)