Escuta de crianças pequenas em situação judicial é tema de seminário na EPM

No dia 22 de março, foi realizado o seminário “Escuta de crianças pequenas em situação judicial”, promovido pela EPM em conjunto com a Coordenadoria da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (CIJ/TJSP) e com a Associação Paulista de Magistrados (Apamagis).

Oferecido nas modalidades presencial e a distância, o evento teve a participação de magistrados, promotores de Justiça, defensores públicos e outros profissionais que atuam na área da Infância e Juventude na capital e no interior do Estado (clique aqui ou acesse a seção “Central de Vídeos” para assistir ao seminário).

A abertura dos trabalhos foi feita pelo desembargador Antonio Carlos Malheiros, coordenador da CIJ/TJSP e da Coordenadoria de Cursos de Iniciação Funcional e Aperfeiçoamento para Servidores da EPM, e teve a presença da juíza Renata Bittencourt Couto da Costa, integrante da CIJ/TJSP. 

O direito de ser ouvida 

A palestra inicial foi proferida pela promotora de Justiça Andrea Santos Souza, que discorreu sobre o direito da criança e do adolescente de serem ouvidos, lembrando que essa é uma inovação da “Convenção dos Direitos da Criança”, da ONU, de 1989, e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990. “Vivemos o momento da inserção eficaz da criança no mundo adulto e isso se expressa com o direito de ser ouvida”, afirmou.

Ela explicou que isso representa o efetivo reconhecimento da criança como pessoa e sujeito de direitos e não apenas como objeto de intervenção judicial. “É fácil entender essa mudança de paradigma no caso da criança de um modo geral, mas é um desafio reconhecer, no caso concreto, que aquela criança, em particular, tem o direito de se manifestar a respeito das situações que vive – principalmente, no caso do adolescente infrator”, frisou. 

A palestrante observou que esse direito vai além da mera participação, criando um novo status e dando visibilidade para a criança no meio adulto. “Isso supera o caráter paternalista ou assistencialista com que o mundo adulto sempre olhava a criança”, ressaltou, lembrando que ela deve ser considerada em sua condição de criança e não na da pessoa que virá a ser, tendo sua individualidade e anseios respeitados. “Os adultos e profissionais do direito passam a ter a obrigação de criar condições para que as crianças pequenas e com necessidades especiais, possam expressar suas opiniões”, salientou. 

Ela lembrou que o direito de ser ouvido é facultativo e frisou que, como todo direito fundamental, cria uma obrigação para os adultos – pais, profissionais envolvidos e o próprio Estado – de dividir com a criança as decisões sobre sua vida, embora a responsabilidade pela decisão ainda seja do adulto. “A criança passa a influenciar na formação do convencimento do juiz, trazendo mais um elemento probatório ao processo”, observou, ponderando que se trata, também, de um direito de empoderamento da criança, que tem o objetivo de levá-la a fazer boas escolhas na vida adulta. “A escuta é um direito da criança e não um favor que estamos fazendo”, concluiu. 

A escuta da criança pequena 

Na sequência, a psicóloga Rosemary Miyahara saudou a iniciativa do seminário, salientando que ele cria condições para se aprofundar a interface entre os campos da Psicologia e do Direito. “Assim, veremos como olhar para a criança como um sujeito de direitos, mas, também, como um sujeito psicológico”, observou. Nesse contexto, discorreu sobre a atuação conjunta entre psicólogos e profissionais do Direito na oitiva de crianças, em especial as pequenas, detalhando parâmetros e focos para a aproximação com a criança.

Entre as estratégias que podem ser utilizadas para se estabelecer uma “cumplicidade recíproca” com a criança, destacou a criação de um espaço de ludicidade ou de brincadeiras: “Nesse espaço, podemos propor conversas e instigar questões, descortinando falas e conhecendo o modo de ser e de agir daquela criança”, explicou, frisando que a busca principal não é a fala, mas o contexto que fará com que essa fala aconteça. “A atuação do psicólogo deve possibilitar que apareça o sujeito subjetivo, que, não necessariamente, está contido no que a criança fala objetivamente”, ressaltou.

A "voz" das crianças

Encerrando o evento, a juíza Renata Bittencourt Couto da Costa salientou que o foco do debate não é a utilização da manifestação da criança como um elemento probatório, mas a mudança de paradigma e a reformulação do sistema, quando a criança e o adolescente  passaram a ser colocados no centro. 

A juíza chamou a atenção para a necessidade do aprimoramento da comunicação com a criança, lembrando as dificuldades encontradas nas audiências concentradas de revisão da situação de crianças e adolescentes em regime de acolhimento institucional, realizadas no ano passado. “Ao falar com uma menina de cinco anos, no início das audiências concentradas, fiquei impressionada com a voz que essas crianças têm e com o quanto podemos aprender ao ouvir seus valores e concepções”, ressaltou, frisando que isso exige um movimento de reflexão para todos os profissionais envolvidos.


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